Neste momento em que falamos tanto no “novo normal”, em que tentamos entender como será a vida no futuro próximo — ou seja, na semana que vem — a gente ouve muito a pergunta “o que vai mudar?”. E aí me chama a atenção o comentário do Jeff Bezos de que a pergunta certa a se fazer nos exercícios de futurologia é “o que NÃO vai mudar?”.
Partindo dessa reflexão comecei a questionar o que mudamos e não deu certo. E aqui vou focar mais em uma abordagem de sustentabilidade ambiental, mas creio que isso pode se ampliar também para outros campos. Claro que muita coisa que mudamos deu certo! Ótimo, vamos aproveitar isso. Mas a ideia aqui é olhar para o que fazíamos tempos atrás de uma maneira muito mais sustentável que hoje.
A partir do pós-guerra, no final dos anos 40 e, principalmente, nos anos 50 começamos a mudar tremendamente nosso estilo de vida. Eu gosto muito de conversar com minha mãe, meu tio, seus primos, todos hoje com mais de 70 anos, e ouvir não só suas histórias, mas como era seu dia-a-dia nesse período em que passaram sua infância e sua adolescência.
Enquanto estou aproveitando a quarentena (e sofrendo) para fazer uma transição capilar, me livrar dos produtos químicos da grande indústria e passar a usar produtos naturais e artesanais, minha mãe me revela que na sua infância e início da adolescência não usava xampu. Simplesmente não tinha xampu pra vender. Ela lavava o cabelo com sabão de coco (um sabão mais delicado, sem tanta soda quanto os atuais sabões de coco usados para limpeza) e usava muita babosa do quintal, chá de camomila, vinagre, limão, tudo o que me aconselham agora a usar nessa transição.
Passemos aos vasilhames. Sim, vasilhame, palavra que nem é conhecida mais, mas que eu cheguei a usar muito. As bebidas eram embaladas em garrafas de vidro. Retornáveis. Simples assim. Sem garrafa pet, sem mil ideias para transformar garrafa pet em vaso, em porta-guardanapo, em quinquilharias que você nunca vai fazer, muito menos usar. Sem o mito do “mas é reciclável”, porque a gente sabe que uma ínfima parte é realmente reciclada, o grosso vai mesmo para as ruas, rios e mares.
Sacolinhas plásticas simplesmente não existiam nos anos 50. Na verdade, nem nos 70, na minha infância. Eu me lembro quando passou a ser lei em São Paulo colocar o lixo em sacos plásticos. Antes disso ele era embrulhado em jornal (sim as pessoas compravam e liam jornal e tinha muito jornal circulando por aí, mas essa é uma outra conversa). Por que será que houve essa lei? Será que foi mesmo uma questão sanitária? Ou terá sido fruto de um lobby da indústria de plástico? Não tenho informações sobre isso, mas tenho intuições.
Nos supermercados (eu sou do tempo já dos supermercados) as compras eram acondicionadas em grandes sacos de papel kraft grosso. E antes disso, na época das mercearias era melhor ainda porque os itens eram vendidos a granel sem esse mundo de embalagens pseudo-recicláveis.
Pra guardar comida na geladeira, nada de filme PVC: tigelas de louça com um pires ou um prato em cima resolviam. E pra lavar a louça, sabão em barra. O detergente não precisa ser líquido e embalado em mais uma garrafinha plástica.
Isso sem falar que eletrodomésticos eram feitos para durar uma vida. Prova disso é a batedeira que eu tenho aqui em casa: mais velha que eu, presente de casamento para minha mãe. E, sim, ainda funciona. Melhor que eu.
Padrões de comportamento sustentáveis não precisam ser inventados. Basta a gente ver como fazia as coisas até muito pouco tempo atrás. E também não adianta só ficar colocando o dedo no nariz do consumidor cobrando dele uma atitude mais sustentável. Claro que cada um pode fazer a sua parte, usar a sua sacola de pano, recusar um canudo plástico e tal. Mas a grande cobrança, a grande pressão tem que ser em cima da indústria, que é, no fim das contas, quem dita esses padrões e quem, muitas vezes, nos deixa sem escolhas.